Curtas & Boas
09-12-2018
- Tuno até morrer ou Tuno com prazo de validade?
É-se Tuno enquanto mantivermos, de alguma forma, ligação ao mundo tuneril. Contudo, creio que há um tempo para tudo e que, ao longo da nossa vida, há estágios diferenciados. A vivência do mester tuneril aos 20 anos não é o mesmo que aos 40 ou 50. Há várias formas de viver o fenómeno tunante (disso são exemplo as tunas de veteranos / quarentunas), seja em palco, seja ensaiando tunas (apesar de já não se estar activo em nenhuma) ou com outro tipo de contributo para a sua tuna ou comunidade tunante.
- Tuna do garrafão ou do ensaio ?
Nenhum dos dois e ambos. Uma tuna não pode viver apenas em função de prestações artísticas, com ensaios e "agenda" que condicionem o convívio, a espontaneidade e o ambiente de descompressão que o estar em Tuna é - porque espaço de refúgio e pausa dos compromissos escolares /profissionais. Mas também não deve, por outro lado, prescindir de critérios de exigência musicais que incentivem o grupo a melhorar e a apresentar algo com qualidade (o que implica disciplina, dedicação e sacrifício). Tudo com conta, peso e medida.
- Festival ou Encontro?
Eu evitaria optar por um em detrimento de outro. Diria, antes, que precisamos muito mais encontros. Se todos reconhecemos que os festivais competitivos impulsionaram, nos últimos anos, a qualidade de muitas das nossas tunas, nem sempre isso se fez sem perdas. Quando, bem sabemos, o calendário de uma tuna quase só aponta competição, deixa pouca margem a tudo o resto que também importa promover. Bastaria colocarmo-nos a questão do impacto que teria nas tunas não haver certames competitivos, para percebermos que, porventura, estaremos a tornar a tuna exclusivamente num bólide de Fórmula 1.
- "Mulher Gorda" ou "Primavera de Vivaldi"?
Em termos estritamente musicais, "Primavera" de Vivaldi. Aliás, já não há muita pachorra para "Mulheres Gordas", quando se trata de certames competitivos.
Contudo, o lado mais amador e informal, para contrabalancear com o lado mais "sério" (que competir em certames exige), é essencia para o tal equilíbrio entre garrafão e ensaio. A Tuna é um grupo musical, antes de mais. É uma questão de prioriades - o que não implica necessariamente abdicar de uma coisa em detrimento de outra.
- Pasacalles ou Serenatas?
O Pasacalles, pois, contrariamente ao imaginário romanceado, o DNA histórico das Tunas é o desfile pelas ruas (pois derivam das comparsas carnavalescas), tocando e pedindo esmola para os mais desfavorecidos (carácter beneficiente que caracterizava as estudantinas/tunas de antanho). A Serenata à senhora, como actividade corrente nas tunas, é algo que se inicia mais tardiamente (em Espanha a partir do Franquismo e, em Portugal, essencialmente a partir da década de 1980, e muito por influência do imaginário ligado ao fado dos estudantes de Coimbra - pois que, antes, as tunas só tocavam peças instrumentais). Além disso, o próprio pasacalles pode sempre ser interrompido para uma serenata à janela.
- Tuna que é tuna vira camas do avesso ou deita-se nas que faz?
Tuna que dorme na cama que faz, claramente. Irreverência não pode jamais ser confundida com delinquência e falta de civismo.
- Mais vale 5 minutos de má fama do que esperar 5.000 para ter da boa?
A melhor fama que uma Tuna pode almejar é dela se dizer que é um grupo de gente boa, educada, simpática, porque, na verdade, a qualidade musical é algo efémero (tão depressa se está no auge como, depois, se faz a travessia do deserto - em função dos recursos humanos de que a tuna vai dispondo).
Não podemos, nem devemos, medir a fama de uma tuna pelo currículo (quem nem mesmo os próprios sabem de cor), mas pela reiterada prática de deixar boa impressão por onde passa. Claro que se, a isso, se colar a ideia de que a Tuna mantém, ao longo do tempo, uma qualidade musical acima da média, certamente reforçará e confirmará o prestígio do grupo.
- Quem não aparece está morto ou nem por isso?
Há uma diferença entre quem não aparece, porque não pode ou, então, porque não quer. Muitas tunas possuem, nas suas fileiras, pessoas já com compromissos que nem sempre possibilitam uma assiduidade e disponibilidade que se tinha quando estudante. Os que não podem mesmo querendo, continuam bem vivos. Depende de quão fortes foram os laços estabelecidos.
Há quem não apareça e não se dé pela sua falta e os que, não estando, continuam bem vivos na memória do grupo.
Vai também muito da forma como a Tuna, enquanto instituição, enquanto grupo, lida com os seus membros (activos ou não) e responde a estas questões. E aí reside, queira-se ou não, os valores em que assenta, vive e promove.
Jean-Pierre Silva
Fundador do Real Tunel Académico - Tuna Universitária de Viseu - 1991.
Fundador da (extinta, em 1998) Tuna da UCP de Viseu - 1992.
Fundador da QuarentuGa - 2016.